3 de mai. de 2009

Deles...

Quem poderia imaginar?

Quem acreditaria caso alguém falasse sobre a mudança dela?

Aquela menina que sempre foi a pegadora, que sempre foi extrema, agora apaixonada, agora presa a um homem só... aquela mesma que nunca saía de uma festa sem ao menos beijar alguém, aquela que tinha fantasias absurdas e extravagantes, aquela que não se entregava a ninguem agora estava ali, deitada na cama, no escuro, recordando...

Relembrando as semanas anteriores, alguns dias apenas. Aqueles dias pelos quais valia a pena viver a semana toda, seja para espera-los, seja para recorda-los.

Mas o travesseiro que usava agora não tinha mais o cheiro dele. Não tinha mais o perfume da Natura que ela esquecera o nome. Não cheirava mais ao desodorante 212 man. Não cheirava mais ao sexo da noite anterior. Talvez fosse isso... mas não somente.

O que a atraíra nele? Não sabia ao certo. Quem sabe tivesse gostado da aparência dele, no inicio. Lembrava vagamente de querer pedir um cigarro dele, mas a vergonha a impedira. Era tímida, afinal. E ele só descobrira tempos depois. Lembrava dele tirando a garrafa de cerveja de suas mãos frias, ora pelo frezzer, ora naturalmente. Mas fora mais que isso.

Olhando pela janela, para o lugar exato em que teve o primeiro contato de âmbito sexual com ele, percebia que os confetes já não caiam mais. O carnaval se fora há dois meses. Dois meses se passaram sem que dormisse com outra pessoa. Era um recorde pra ela. Um recorde do qual, ao contrario dos outros, se orgulhava. E embora os confetes não mais caíssem, os últimos grudaram em sua pele suada.

A pele suada que adorava ter embaixo do seu corpo. A pele quente do mesmo dono cujo sexo invadia o seu. A pele suave do mesmo dono que dormia ao seu lado ou a abraçava em longas horas de insônia. A pele marcada por unhas, mordidas e chupões...

Quando olhou para o lado, quase pode vê-lo. Foi como quando acordou de madrugada e não acreditou que ele estava dormindo ao seu lado, numa intimidade que nunca tivera igual. Pensara estar sonhando. Estava, no presente, mas não no contexto.

Analisando o ultimo, percebia que desde o domingo em que ele fora embora da festa, o mesmo domingo em que a levara pra casa depois de estacionar o carro numa rua paralela para saciar a sede de prazer de ambos, desde tal dia pensava nele. Entrara em casa com o mesmo sorriso contido que tinha nos lábios cada vez que ouvia o nome dele. Andrei.... Andrei... a musicalidade do nome seguia a musicalidade do toque, do andar, do abrir a porta do elevador e acender a luz do corredor e os passos arrastados e o sorriso brincando com os lábios e o corpo dela de encontro da porta e o cumprimento e as mãos dele tocando o rosto dela e as mãos dela tocando a nuca e o pescoço dele e o beijo e a mochila sendo deixada sobre a mesa e a porta sendo trancada...

Tudo isso fazia falta agora. Parecia distante. Parecia surreal.

Diante do escuro, do quarto que era seu mas no qual não se sentia em casa, diante das perspectivas frustradas que as paredes guardavam em segredo, diante da janela que gritava enquanto apontava para a rua deserta, diante das musicas que ouvira com ele, diante das lembranças, deixava as lagrimas rolarem pelo rosto. Lagrimas estas carregadas de todo sal que poderia eliminar, porque devia estar doce pra ele. o mais doce possível para quem sabe ouvi-lo repetir ‘Que querida que você está hoje’.

Agora só queria lembrar. Por isso não podia se explicar, por isso não podia conversar ou elaborar qualquer pensamento lógico. Porque a lógica estragaria a magia do momento que viveram juntos. Qualquer palavra mancharia o momento em que ele disse ‘nós dois’, deitado ao lado dela, abraçava-a enquanto ela assistia seu seriado favorito e ele, por sua vez, já deveria estar no trabalho.

E o Andrei que conhecera no carnaval, cujo sexo fora o melhor que já provara, mudara. O sexo com ele mudara, as palavras dele mudaram. E naquele dia ele realmente quis aconselha-la, coisa que ela não pôde deixar. Não suportaria ouvi-lo concordar com os pais, os mesmos pais que a chamavam de vadia e drogada. Era apenas uma criança que usava maquiagem e alisava os cabelos.

Uma criança que ele estava conhecendo, talvez até gostando...não, não talvez, era fato. Ele dissera. E dissera com um dizer embaçado, torcido, como se não quisesse ser pronunciado e como se a pronuncia não pudesse alcançar a magnitude do sentimento. Nenhuma palavra conseguiria. E ela acreditava.

Acreditava da mesma forma que acreditou quando ele dissera que estava a dez dias sem fumar, como acreditou que ele achava que ela era vegetariana. Enganara-se. Depois descobriu como faze-la arrepiar. Descobriu o prazer de dar prazer a ela. Descobriu até mesmo que ela estava a um passo de ama-lo. E mais ainda, descobriu que ela, em sua inocência e incoerência, não esperava que ele retribuísse pronta ou proporcionalmente. Ela ficaria feliz em saber apenas que ele pensara nela, ou que esperara pela ligação dela que nunca chegou e não fez valer o dia.

E agora, aquela menina que ninguem acreditava ser capaz de se amarrar, lembrava das frases trocadas por eles durante o sexo, depois do sexo, das conversas... lembrava dele jogando água nela por cima do boxe, molhando todo o banheiro... lembrava de acordar sorrindo por vê-lo espreguiçar ao seu lado e abraça-lo antes de preparar o café da manhã. Mas lembrava, sobretudo, da alegria que se instalava em seu peito de gelo quando ele estava ao seu lado.

Ninguem acreditava, nem mesmo o espelho. E era uma descrença bem vinda, porque aqueles eram momentos dela...deles.