26 de dez. de 2008

O Preço

O que restou de fato? A cama vazia ao meu lado. Insônia.

O que me fere? A dor que não provoquei.

O espelho mostra a puta que se esconde inutilmente em pijama de menina e um rosto ausente de maquiagem. Mas o espelho não mente, apenas reflete a realidade, o mundo morto ao seu redor. O reflexo é de uma mente que luta para apagar o passado apegando-se a ele numa onda de saudosismo que, ao mesmo tempo, tenta negar. Uma cabeça conturbada. Um corpo frágil, magro, quase sem curvas. Ombros com ossos pronunciados, saboneteiras fundas, seios pequenos apontando a própria imagem, perplexos. A cintura fina, o umbigo, os ossos da virilha. O sexo nu, rosado, apertado em seus temores. Também tenho meus caprichos.

Um deles é nega-los. Ver sair dos lábios, sejam vermelhos como cereja ou negros como a morte, as frases feitas que correm pelo mundo em seus sotaques. ‘O meu prazer é o seu prazer’. ‘ Não se preocupe, eu faço de tudo’. ‘Isso me excita’, embora eu saiba que é mentira. Mas de alguma forma ainda ouço os ecos da infância interrompida.

Aqueles rostos que preenchem meus sonhos são os donos dos membros que puderam me levar mais perto da entrada do meu jardim particular. De que adianta? Não tenho a chave. Acho que a perdi. Possivelmente escorregou pela alça da calcinha, levantada, na ultima cama em que me deitei. De quem era, não me lembro. Foi bom, me perguntam. Silencio.

Não que não tenha sido. Gostei do modo como aquela língua invadiu meu sexo, de como aqueles braços me viraram na cama e no chão, ou de como aquelas mãos seguraram meu cabelo ou me puxaram pra junto de si. Rebole mais, sinta tudo dentro de você.

(Contive o desejo de bocejar.)

É como se faltasse alguma coisa. Falta perversão, com certeza. O bizarro, a dor, as posições diferenciadas, tudo isso me atrai. Falta também, um olhar. Aqueles olhares de tirar o fôlego. Os olhos que não apenas te olham, mas também despem, consomem, beijam, fodem, gozam e amam. Porque sexo por sexo, não minto, faço. Mas depois de fazer amor, uma primeira vez, é que se percebe o quanto se tem valor.

Um valor maior do que qualquer homem é capaz de pagar. E eu não sabia disso. Não tinha o real conhecimento de que valia alguma coisa maior que notas de papel e moedas barulhentas ao cair no chão ao meu lado. Não sabia que é permitido levantar para receber o pagamento. Beijar depois do exaustivo sexo. Adormecer nos braços do homem que me deixou completamente suada, molhada, gozada... o sono mais doce, o despertar mais suave.

O som da respiração ofegante, o sobe e desce do peito arfante, os pelos que roçam o rosto, o gozo que brilha sobre a pele, os cabelos despenteados, gemidos, marcas de mordias pelo corpo, saliva, suor, sexo sensível, som externo, crianças brincando, lençol úmido, chupões, sol perfurando a cortina, abraço apaixonado, cansaço, rugas de expressão, luar entrando pela janela, dor suave, suspiro, adormecer...

Tudo isso não existe mais.

Sobrou a cama vazia, a puta encarcerada pagando por seus crimes.

22 de dez. de 2008

Hey you

Ela estava sentada no colo dele. Tinha a taça de vinho na mão direita. A esquerda, por sua vez, percorria a nuca do amado. (Amado mesmo?) Ele mantinha os olhos na altura dos seus. Ainda não estava completamente recuperado do acidente, mas seu sorriso continuara intacto. Sabiam que aquela era a única coisa que ninguém poderia roubar, a alegria. Em compensação, o amor...

Ele sorriu e pediu se ela se importaria caso ele resolvesse abrir o orkut para checar seus scraps. Lógico, não se importava. Levantou com o pretexto de buscar mais vinho para que ele tivesse privacidade, mas antes que se colocasse inteiramente em pé duas mãos seguraram-lhe pela cintura obrigando-a a sentar novamente.

-         sua taça ainda está cheia.

-         Mas a sua está vazia.

-         Eu bebo da sua, então.

Com os lábios entre abertos, ele aproximou a boca da taça. Ela virou devagar para que ele bebesse um curto gole e depois o beijou. Beijou-o com amor. (Amor?) Permaneceu sentada enquanto ele clicava aqui, ali e acolá. Sorria com suas ironias internas, suas piadas particulares. Assustou-se quando ele fechou a janela aberta na tela e a encarou.

-         voce não vai ver os perfis de quem te visitou?- ela pediu.

-         Não. não vejo necessidade... porque?- ele parecia se divertir.

-         Eu vejo sempre...

-         Mas agora eu prefiro deitar você naquele colchão a ficar vendo orkut.

-         Só me deitar?

Ele sorriu novamente. Amariam-se novamente em três minutos. Dois... Um...


Depois de meses, ele lembrou disso tudo. Como se não bastasse, quis que ela o fizesse. Talvez estivesse com saudades. Talvez quisesse alertá-la. Talvez fosse somente curiosidade. Quem sabe tivera medo de deixar qualquer recado, qualquer comentário em alguma foto, afinal, a namorada poderia reclamar. "Como assim, voce está deixando recadinhos pra sua ex?" ela diria.

Mas ela não tinha ciúmes da atual namorada. Tinha uma certa inveja dos sorrisos, risos, lagrimas que a privava de partilhar com ele. Eram amigos, afinal. A nova sim, ela era a namorada, aquela que ele chamava de ‘amor’. Era além de sua compreensão os motivos que levaram ao cabo do relacionamento. Primeiro, os dramas, os jogos que ela se forçava a jogar. Depois, as palavras que sua educação impedira de pronunciar; tal qual ‘eu te amo’. E por fim, a presença da nova mulher (mulher e não menina como ela).

Como uma criança feito ela poderia competir com a outra? A primeira com suas unhas sem pintar (porque ele não gostava), seus cabelos longos e negros caindo pelas costas, seu corpo magro, fino, ágil, seus olhos tristes. E a segunda com suas unhas feitas (supunha), seus cabelos loiros perfeitamente arrumados, suas roupas de grife e seu sorriso falso. A primeira sempre valorizando os livros que ambos leram, enquanto a segunda, quantos copos de cerveja partilharam.

Quem sabe ele tivesse tentado preveni-la de uma surpresa qualquer. Quem sabe estivesse realmente com saudades ou receio de encontra-la e não saber como agir. Ela não sabia.

Ou talvez quisesse somente lembra-la de que a vida continua e que ela ainda poderia amar alguém que não fosse ele ou o seu amigo.

Mas as vozes que ouviram juntos naquele dia ainda pairavam em sua mente farta de interpretações; Open your heart, I’m coming home. De fato, ele voltava pra casa.

O riso que precede o adeus

Ao menos ainda existe algo concreto. Algo físico aquém de seus próprios ferimentos. Ainda havia o suporte de copos. Roubaram aquela noite no bar. Ele usava um terno, tão lindo, tão perfeito. Ela usava a blusinha roxa que tanto gostava e as botas de salto fino. Ele a ajudara a caminhar pelas ruas disformes, rira com ela dos passos incertos. Beberam juntos. Riram juntos. Fizeram planos!

Tinham feito, realmente, planos!

E não só naquela noite, em tantas outras... combinaram de ir a München participar da OktoberFest, combinaram festas, finais de semanas que nunca aconteceram, casamentos, filhos. Sempre quisera dar um filho a ele. Vira o cuidado que ele tinha com as crianças, vira os olhos brilharem ao falar de filhos... combinaram de ir juntos na formatura dela...

Preparara os pais para o encontro. 

Terminaram uma semana depois.

E agora o que restara? Uma rima perdida, uma flor morta, a bolacha do chopp, um vendaval disperso, a lembrança do riso. Aquele riso! Quando ele ria a fazia despertar de todos os seus delírios, de todas suas depressões. O riso que interrompeu o beijo, cortou a fala. O riso. Ele devia desconhecer tal poder.

Há tempos não o via rir como naqueles dias. Sob o sereno, a uma da manha no terraço do prédio, enquanto tentava ensina-la a dançar forró. Na noite enquanto assistiam filme, exaustos depois do sexo. Ao vê-la chegar ao pé da escada e fechar a porta atrás de si um segundo antes de se jogar em seus braços. Quando ela tocava a campainha da sua casa afim de passar apenas uma hora com ele. Quando queria faze-la rir.

E aquele bar!

A noite mais perfeita, o sorriso mais puro, as juras mais sinceras.

-         Acredite quando eu digo que te amo.

Ou então, Always... and I will love you baby, always!

E ainda havia o acidente… 

A foto…

O thank you for loving me… 

Os CDs... 

Os filmes...

As musicas...

Pior que tudo; a saudade.

Início

Não sei se vou dar continuidade ao blog, se vou ter empenho de postar todos os dias, uma vez por semana, por mês... É fato que corro o risco de esquecer de sua frágil existência, mas enquanto ainda posso lembrar, que seja uma boa experiência. Enquanto a inspiração, ou melhor, a coragem de postar algo escrito recentemente não me invade entrego-me ao torpor do por-do-sol desejando que a noite não tarde.