21 de mar. de 2009

Fugir

E quando penso em fugir, já não tenho mais coragem. Algo me prende aqui. Algo que foge às teorias, foge a qualquer explicação. A diferença entre mim e as outras pessoas é que não sou capaz de sentir verdadeiramente saudade das coisas. Porque saudade se sente quando as coisas terminaram, quando as pessoas vão definitivamente embora, e as coisas e as pessoas continuam em mim, pulsam nas minhas veias aumentando a pressão, ansiando por explodir comigo e consigo.

As memórias na minha agenda ainda me consomem, tal como o cheiro de cigarro e maconha que ficou no ar, tal como a cama desarrumada e vazia, os travesseiros organizados cuidadosamente, a xícara imóvel sobre a mesa e o isqueiro em minhas mãos. A eterna lembrança das palavras que soaram quase como um ‘eu te amo’, mas que na verdade foram ‘eu poderia ter te deixado um beck pronto, caso você queira fumar depois’. E por mais que digam que é errado, que é loucura ou que é coisa de puta, prossigo até que meu coração decida parar de bater.

Porque ir pro inferno, por ir pro inferno, assinei minha sentença com floreios há anos. Dormi com ele e com ele e com ele... Bebi demais, fumei demais. Afinal, humana é o que eu sou. Anjo, deixei de ser há tempos, apenas a máscara permaneceu. A fantasia imaculada de anjo calmo, protetor e preocupado com os outros.

Mas a medida que a ausência, nunca saudade, foi aumentando progressivamente, meu mundo foi desmoronando. Em meio a sons, cores (como a luz da sala, que subitamente ficou verde), emoções, lágrimas, gemidos de prazer e dor, puxões de cabelo, palavras soltas me perseguiam. Fantasmas em pânico. Urgentes de atenção, as palavras eram nada mais que fragmentos de frases nunca ditas, de sentimentos nunca sentidos, ilusões nunca vividas em plenitude.

Tal ausência me provoca desejos, arranca sensações. Desejos de álcool, sexo, drogas, rock n’roll, café, chocolate, livros. A ausência me ensinou a compreender meu passado, porque não existe história sem essa concepção. Me ensinou a não querer mudar o que já aconteceu, me ensinou a aceitar apenas. Esses ensinamentos foram essenciais para que eu chegasse até aqui.

Agora que cheguei, não tenho coragem de fugir.

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